A Escola de Braga e a Formação Humanística - Tradição e Inovação
Maria Celeste Natário, José Gama (Coord.), 428 págs., 2010
Maria Celeste Natário, José Gama (Coord.), 428 págs., 2010
A Escola de Braga foi o pretexto e desafio e desafio mobilizador de todos aqueles que de algum modo estão ligados à Faculdade de Filosofia de Braga da Universidade Católica Portuguesa e aos cursos nela leccionados neste último meio século, para participarem no Colóquio A Escola de Braga e a Formação Humanística - Tradição e Inovação. E, pelo que tem de comum com outras instituições e centros de investigação, motivou a colaboração do Grupo de Investigação "Raízes e Horizontes da Filosofia e da Cultura em Portugal", do Instituto de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, associando-se ao projecto com o tema do "neotomismo".
A Escola de Braga significa os saberes que introduziu no panorama cultural português, os mestres que os transmitiram e transmitem, e as múltiplas gerações de licenciados com a sua vivência pessoal e experiência profissional, na sua história mais recente. Queremos aqui apenas sublinhar, como fizemos na baertura do Colóquio, o valor e a actualidade de um programa de formação que se mantém fiel às grandes ideias humanistas que formaram e educaram a Europa ao longo dos séculos. Entre estas ideias humanistas sobressaem o cultivo da sabedoria, com um conhecimento desinteressado, ao serviço da dignidade e da nobreza do espírito, na criação da beleza...
Ideias estas que sempre tiveram na filosofia e nas humanidades o suporte e a expressão mais aperfeiçoada e mais exigente, em contraste flagrante com a invasão crescente do uso de máquinas e instrumentos tecnológicos que tendem a absorver e a dominar, por vezes até a subverter, o ideal tradicional da sabedoria humanística. Será a cultura destas grandes ideias humanísticas, na prática da vida social, mas também e sobretudo nos programas e nas práticas de ensino, que poderá habilitar-nos a sermos capazes de valorizar correctamente os novos valores da ciência e das tecnologias, relativizando-os e subordinando-os às superiores exigências do espírito.
Certamente que estes valores, este ideal de humanismo filosófico, literário e artístico, não são património nem memória exclusiva da Escola de Braga.
É um património universal, com maior enraizamento e desenvolvimento na cultura ocidental, e que é comum à nossa prática histórica nacional. Mas talvez possamos dizer que nesta Escola está mais presente aquela dualidade primordial, constitutiva da substância da Europa: a herança dupla de Atenas e de Jerusalém, que corresponde a um, o quarto, dos cinco axiomas que definem a Europa, nas palavras do intelectual escritor George Steiner, que acrescenta o seguinte: "O topos é agora tão rico e premente como sempre. Ser europeu é tentar negociar, moralmente, intelectualmente e existencialmente, os ideais, afirmações, praxis rivais da cidade de Sócrates e da cidade de Isaías".
Mas importa olhar para o presente, para a realidade do nosso panorama nacional, e apontar o défice crescente da formação humanística, para que o lugar que pertence à filosofia e às humanidades não venha a esvaziar-se desse papel modelador das consciências e dos valores que desempenhou ao longo dos séculos e que permanece como modelo válido e até agora inultrapassado. Lembrar a matriz filosófico-humanística dos cursos ministrados nesta Escola de é para nós, nestes dias, uma oportunidade de reflexão e de definição de um caminho que julgamos válido, ainda que exija actualização e revitalização do caminho já percorrido. Não deixa de ser válida, salvas as devidas proporções, a célebre descrição da relação existente entre alunos e respectivos mestres, feita por Bernardo de Chartres, filósofo e monge do séc. XII: «Anões empoleirados nos ombros de gigantes».
É também a ideia de futuro, como inovação, que nos orientou na realização deste Colóquio. Esperamos que os escritos dos trabalhos aqui publicados sirvam de apoio na continuidade da investigação do modelo filosófico-humanístico que orientou a reflexão deste encontro científico, com a participação e com o mesmo empenhamento que envolveu a Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Filosofia de Braga na elaboração do projecto e na sua realização.
A presente edição é uma publicação conjunta do Grupo de Investigação Raízes e Horizontes da Filosofia e da Cultura em Portugual, do Instituto de Filosofia da Faculdade de Letras da UP, e do Centro de Estudos Filosóficos e Humanísticos da Faculdade de Filosofia de Braga da UCP, apoiada pela FCT.