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Resumo Existem várias leituras da questão (Q) que dá título a este ensaio. Não obstante, pensamos que apenas duas dessas leituras são adequadas, no sentido em que são as únicas realmente interessantes do ponto de vista filosófico. Diremos que a primeira é uma leitura forte, porque mais exigente que a segunda, e diremos desta que é mais fraca, porque menos exigente do que aquela. Considerando, como faremos adiante, que a justificação referida em Q é justificação epistémica ultima facie e que a percepção visada é do tipo sensorial, a leitura forte é da nossa perspectiva a seguinte: (Qfo) Pode a percepção justificar todas as nossas crenças acerca da realidade? Já a leitura fraca é a seguinte: (Qfr) Pode a percepção justificar muitas das nossas crenças acerca da realidade? Depois de tentarmos identificar concisamente os conceitos de percepção, de crença perceptual, de justificação e de realidade que nos interessam para efeitos de uma resposta cabal a Qfo e Qfr, defenderemos uma resposta negativa a Qfo e uma resposta afirmativa a Qfr. Para levar a cabo essa defesa de forma sistemática, submetemos os nossos argumentos em três fases. No primeiro momento, tomamos a visão como exemplo paradigmático de percepção e mostramos que as mais salientes teorias disponíveis na literatura acerca da visão não impossibilitam uma resposta afirmativa a Qfr. No segundo momento tentamos mostrar que os casos clássicos de erro perceptual massivo e os fenómenos empiricamente demonstráveis de cegueira-à-mudança e de cegueira-porinatenção nos obrigam a dar uma resposta negativa a Qfo. No terceiro momento tentamos reforçar uma resposta afirmativa a Qfr. Crucialmente, sustentamos que a eficácia da acção, actual ou possível, motivada por crenças acerca da realidade formadas a partir de evidência perceptual, fundamenta e legitima essa mesma evidência perceptual, o que por sua vez possibilita que essas crenças estejam ultima facie justificadas. Palavras-chave: crença, evidência, justificação, percepção, visão
Abstract There several interpretations to the question (Q) placed by the title of this essay. Be as it may, we think that only two of those readings are adequate, in the sense of being philosophically stimulating. We shall say of the first one that it is a strong interpretation, since it is more demanding than the second, and we shall say of the latter that it is a weak interpretation, since it is less demanding than the former. Assuming that the kind of justification mentioned in Q is ultima facie epistemic justification, and that the kind of perception at stake is sensorial perception, the strong interpretation is, from our perspective, the following: (Qs) Can perception justify all our beliefs about the reality? The weak interpretation is: (Qw) Can perception justify many of our beliefs about the reality? Following an attempt to succinctly identify the concepts of perception, perceptual belief, justification and reality that matter to us considering a proper response to Qs and Qw, we shall defend a negative answer to Qs and a positive answer to Qw. In order to pursue such a defense in a systematic way, we will submit our arguments in three stages. In the first stage we take vision as a paradigmatic case of perception and show that the more noticeable theories about vision available in the literature do not preclude a positive answer to Qw. In the second stage we try to show that the classical cases of massive perceptual error and the empirically demonstrable phenomena of changeblindness and inattention-blindness force us to answer negatively to Qs. In the third stage we aim at securing a positive answer to Qw. Crucially, we hold that the efficiency of an action, actual or just possible, motivated by beliefs about reality caused by perceptual evidence, grounds and vouch for that very perceptual evidence, which in turn allows that those beliefs become ultima facie justified. Keywords : belief, evidence, justification, perception, vision |